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Vamos juntas navegar nossas pacientes pelas tempestades de espera sem fim?

A luta pela demora na resposta do diagnóstico oncológico, entre a suspeita de câncer e a confirmação é desgastante para todos os envolvidos. Uma vez diagnosticado, o câncer não espera, mas a paciente é obrigada a esperar. Mesmo com as Leis dos 30 e 60 Dias e uma garantia teórica de 90 dias para a realização de todo o processo no SUS, a realidade para muitos brasileiros e brasileiras é completamente outra.

Na teoria, quase uma década depois, a Lei dos 60 Dias é uma história de sucesso internacional, pois muitos países usam o modelo brasileiro para criarem leis e políticas  públicas de atenção ao câncer. Mais recentemente, a Organização Mundial de Saúde incluiu a indicação dos 60 dias como prazo máximo entre o diagnóstico e o tratamento de câncer de mama como uma política de saúde a ser seguida no mundo. 

Entretanto, o simples ato de aprovar leis e ter o direito garantido não é o suficiente para dizer que todos os problemas acabem e o tempo de espera comece a diminuir. Além disso, num cenário de crise sanitária internacional e pandemia de doenças infectocontagiosas, por exemplo, leis como essa acabam não funcionando corretamente, e o poder público sempre alega “motivo de força maior”.

Mesmo sem a pandemia da COVID-19, há apenas alguns anos, no Rio de Janeiro, o tempo de espera para que pacientes iniciassem seu primeiro tratamento no SUS era de 212 dias. Dados daquela época do Sistema Estadual de Regulação (SER) mostraram que a Lei dos 60 dias foi cumprida em apenas 52,5% dos casos de tumores de mama atendidos pelo SUS no estado. Mas quando o primeiro tratamento era a cirurgia, esse índice caiu para 11%.

Esse estudo faz parte de um levantamento realizado entre 2017 e 2018 pela Dra. Sandra Gioia, embrião para um dos primeiros programas-piloto de navegação de pacientes do País, que busca tornar-se uma política pública na cidade do Rio de Janeiro. Programas como este são importantes ferramentas para aumentar a implementação da Lei dos 30 e 60 dias, agilizando as etapas da jornada do paciente e a luta pelos direitos adquiridos com as políticas públicas que tão arduamente lutamos todos os dias.

A própria FEMAMA realizou, entre 2017 e 2018, um projeto piloto de navegação de pacientes nas áreas remotas e rurais de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, e descobriu alguns gargalos no cuidado do câncer na cidade. Inspirado por um programa internacional, o projeto queria garantir informação e orientação qualificada às pacientes de câncer de mama, acesso ágil e adequado ao diagnóstico e tratamento na rede pública de assistência à saúde. 

Num dos casos mais radicais, por exemplo, a paciente estava esperando há 208 dias pelo resultado do diagnóstico de câncer de mama até a intervenção das assistentes, o que reflete alguns casos no País. Mais de 30% das mulheres tinham demandas de saúde mental e necessitavam de apoio e atendimento profissional, pois tinham sentimentos de angústia causados pelo adoecimento e alterações psicossociais em toda a estrutura familiar. Elas eram, então, encaminhadas para a rede de assistência especializada.

Quase 25% delas tinham carências financeiras: sequer tinham dinheiro para pagar o transporte público para se consultar, fazer os exames ou o tratamento que precisavam fazer na unidade de saúde. Quem fazia esvaziamento da axila e podia ser considerada pessoa com deficiência, era então encaminhada para a autoridade de trânsito para ter acesso à isenção do vale transporte.

As assistentes sociais estavam em contato direto com as pacientes diariamente, levando orientação e informação, além de guiá-las e interceder nas dificuldades que encontravam. Temos provas suficientes em todo o País que os programas de navegação de pacientes funcionam sim. O caso do Rio de Janeiro e de Porto Alegre foram apenas alguns exemplos. Diversas ONGs associadas à FEMAMA, em todas as regiões do Brasil, possuem programas muito bem estruturados e que são referência.

Um destes exemplos foi desenvolvido pela própria Dra. Sandra Gioia em São João do Meriti, em parceria com o Instituto Avon, que conseguiu por meio da Navegação de Pacientes encurtar importantes barreiras no diagnóstico e tratamento das pacientes chegando, nos anos de 2019 a 2020 a alcançar 82% de sucesso no cumprimeto da Lei dos 60 Dias para as pacientes diagnosticadas participantes do Projeto – resultado bastante representativo em comparação aos 24% de cumprimento no período que precedeu o projeto. 

Dados como esses pressionam o poder público para que preste mais atenção para as demandas da sociedade e invista no cumprimento da Lei dos 30 e dos 60 Dias. O Painel-Oncologia, elaborado pelo Instituto Nacional  do Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA) e lançado em 2019 para monitorar o percentual de pacientes que fazem seu primeiro tratamento no prazo de 60 dias, ainda não é o suficiente. A falta da correta aplicação e fiscalização das leis que diminuem o tempo de espera no cuidado oncológico se agravou ainda mais durante a pandemia da COVID-19, que fez com que a crise sanitária que o combate ao câncer já passava, ficasse ainda pior.

A jornada da paciente de câncer de mama ou de qualquer paciente oncológico é o motivo pelo qual associações de pacientes como nós estamos aqui. Programas de Navegação de Pacientes são extremamente eficientes e importantes para melhor guiar as mulheres antes, durante e depois do câncer. Esses programas surgiram justamente para otimizar o caminho das mulheres no SUS, muitas vezes devido à ineficiência e a demora do sistema ou por falta de informação e desconhecimento das próprias pacientes.

Por isso, a hora é agora. Não podemos esperar mais. Nós, da FEMAMA e de sua rede de ONGs associadas, inclusive o Instituto Avon, acreditamos que o Programa Navegação de Pacientes deveria ser política pública nacional e implantada em todos os municípios do Brasil. Vamos juntas navegar nossas pacientes pelas tempestades de espera sem fim? Com tantos exemplos positivos e comprobatórios, precisamos transformar a navegação de pacientes em política pública nacional, com metas bem definidas e acompanhamento de resultados que demonstrem como implementar essa tecnologia social pode transformar a realidade do câncer de mama em nosso país – desde a redução dos diagnósticos tardios da doença, redução dos intervalos para tratamento e por fim, redução da mortalidade por câncer de mama no Brasil.

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